LITERATURA EM TEMPOS DE PANDEMIA VII



                                         
                                               Vânia Maria de Melo Morais

 Vânia Morais, nasceu em Lagoa da Prata, Minas Gerais aos 08 de novembro de 1973. Filha de Ronaldo Manoel de Melo e Maria Zélia Fonseca Melo. Professora de Matemática, mas sempre gostou de brincar com as letras. Seu dom literário teve grande influência dos avós maternos. Cresceu ouvindo histórias. Gosta muito de escrever e ler. A maioria do que escreve divulga no Recanto das Letras, um site cultural. Já teve textos publicados em livros e jornais. Sempre incentivou seus alunos na arte de ler e escrever. É acadêmica benemérita da Acadelp.


                                                 ELA E A PANDEMIA

Naquele dia ela chegou em casa mais cedo do trabalho, estava muito cansada, seu corpo doía mas mesmo assim, não foi direto tomar seu banho sagrado, antes ligou seu televisor nos noticiários e se deparou com noticias funestas. Depois que a OMS declarou que o novo coronavírus se tratava de uma pandemia e que se espalhava por todo o mundo com grande rapidez e intensidade aquilo se tornou para ela obsessão. Estava ávida para saber de tudo. Na China, mais precisamente na cidade onde tudo começou Whuan, estava isolada das demais, as pessoas estavam afastadas umas das outras, os idosos estavam morrendo, eram acometidos por uma infecção que atacava principalmente os pulmões e órgãos fracos, medidas de controles sanitárias foram tomadas, lavar bem as mãos, uso de álcool em gel, máscaras, do não poder ter contato físico uns com os outros e o uso de luvas. De repente o grande bum. A Europa foi atingida, a Itália foi à primeira, o governador italiano não acreditou, por se tratar de país de primeiro mundo, estava tudo controlado, ledo engano, começou o inevitável, a explosão causou o caos, os médicos nunca viram nada igual, o sucateamento na área de saúde, velhinhos morrendo, a escolha de quem deve morrer e quem deve viver, não há leitos suficientes. O país de primeiro mundo se vê sozinho, outros países fecham suas fronteiras com a Itália, o governo decreta estado de calamidade, agora ele acorda, tarde demais, pede desculpas, faz igual a China. Enquanto isso, ela sozinha em sua casa, chora por não poder ajudar ninguém, então, no silêncio do seu quarto, ela faz uma prece qualquer a Deus para que cesse essa pandemia. As lágrimas que agora rolam de seus olhos lhe fere a alma, ela teme pelos que ama. Olha para o relógio são 18:45 hs, vai para o banheiro e toma um banho demorado, pensa nas várias vítimas da Covid-19, tanto nas que morreram quanto nas que estão bem. Passa em sua cabeça que enquanto alguns estão sofrendo outros estão comemorando a vitória, há mortos mas há também vivos. Só que os mortos sequer podem ser sepultados com dignidade, muitas vezes são cremados, são embrulhados em sacos plásticos, o caixão é lacrado, o enterro é rápido e sem muitas pessoas. O vírus invisível causando tanta dor visível. Ela sabe que de cada mal se deve tirar um bem maior, mas ela sofre com a dor do outro, a dor do outro está doendo nela. Ali debaixo d’água sua nudez a fez enxergar a indiferença do mundo que se cala perante a vida, fosse uma, deveria valer tudo. O mundo capitalista só pensa na economia e não no ser humano. Ela sofre, ela reza, ela chora, ela grita... por hora ela nada pode fazer, os infectologistas, os médicos, os cientistas, os enfermeiros, os leigos, as fakes News, os bons, os maus, os legalistas, os espertos, os críticos, os políticos, os religiosos, os noticiários... e ela.. no meio disso tudo! Tem comido mal, dormido mal, a partir de manhã em seu trabalho irá trabalhar só meio período, terá que economizar para controlar seus gastos. Como mora sozinha, teme ficar mais deprimida ainda, o silêncio será seu companheiro ensurdecedor, o televisor seu algoz mais impiedoso, sua casa a prisão mais tenebrosa, claro que fará o possível para continuar com suas orações diárias, procurar programas que vençam os males que a atormentam, afugentar seus fantasmas. Ela é frágil, tem alma dócil, sempre sofre com os que sofrem. Ela, ela teme pegar essa doença e morrer sozinha, porque solidão não é sua pior inimiga, mas sua pior arma contra sua alma dolorida! Agora ela chora, lágrimas sufocantes de alguém que só quer mais um dia para lutar contra si mesma.
Lá fora a Covid-19 mata lenta e silenciosamente homens, mulheres, jovens e crianças, e enquanto isso, muitas vezes, no isolamento social e ela sabe disso, que há um vírus muito pior, que mata mais, o medo irracional do desconhecido, da insegurança, da incerteza do amanhã.
Sua fé estava abalada. Nem a igreja podia ir, tudo se resumia nas mídias sociais. Estava enclausurada.
“Insônia, fobias, manias, limpezas, exageros, conversas imaginárias, silêncio, sol, chuva, vento, quarentena, quaresma, luto, luta, travessia, lixo, poeira, sofá, comida, desânimo, notícias, ressurreição, Ele está no meio de nós!. Quem? O coronavírus? Não. O Cristo! Graças a Deus. Mas o coronavírus também está. Até quando? Previsão, até 2022. Li hoje.”
Essa é a conversa dela, com ela mesma! Será loucura? Não, apenas uma válvula de escape para permanecer lúcida porque a terra parou, e até que amanhã seja um novo dia é melhor se adaptar, ela arrumou um amigo imaginário, talvez o de sua infância. Vai saber, só ela sabe. Às vezes ele nunca a deixou sozinha! Ela está se defendo apenas para sobreviver!


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