LITERATURA EM TEMPOS DE PANDEMIA


                                                       MARINA ALVES GONTIJO



MARINA ALVES GONTIJO é natural de Lagoa da Prata - MG. Graduada em Pedagogia, pós-graduada em Psicopedagogia. É membro da Academia Lagopratense de Letas - ACADELP. Conta com trabalhos publicados em antologias, revistas de circulação nacional e jornais locais. Premiada em três concursos literários. Escritora, poetisa, escreve no site de literatura Recanto das Letras. Redes Sociais e Blogs especializados. Autora do livro "Sombra e Assombrações"(2007) e outros trabalhos inéditos em diversos gêneros.

                               “EU QUERO A MINHA VIDA DE VOLTA!”

À sua volta deslizam homens e mulheres dia e noite, sem parar: são médicos e enfermeiras que se dedicam integralmente, 24 horas por dia, no afã de lhe salvar a vida. Covid- 19. Há quase vinte dias ele perdeu o contato com a realidade, quando internou-se às pressas, num quadro de insuficiência respiratória. Desde então, ele nem sabe que ainda vive, embora a vida ainda o habite, mesmo que por um tubo ligado ao respirador.

Os dias escorrem lentamente. Aqui fora a família nada pode fazer. Não pode vê-lo, nem por uns míseros minutos, nem através de um vidro. Tudo nesse caso é vetado, é proibido. Notícias só por telefone, com hora marcada quando o boletim médico informa tecnicamente o quadro de saúde: é uma vitória ouvir que a febre baixou, ou a pressão arterial estabilizou.

Todos os dias são iguais, todos são angustiantes. Entre homens e mulheres de uniforme verde e máscara, ele não sabe de nada, vive sem viver, sem se dar conta de que lá fora muitos o esperam desesperadamente; que por ele há correntes de rezas e preces em todos os credos possíveis, pois ele é amado como ninguém, e uma legião de amigos e familiares o querem rindo e feliz como sempre foi.

Dentre as quatro paredes da terapia intensiva tudo é incerto... enquanto lá fora grande parte da população em isolamento, clama: “Eu quero a minha vida de volta!”. Ninguém aguenta mais ficar em casa, se privar das festas, sair às ruas, voltar ao convívio social, retomar a rotina. Ele, se pudesse, também pediria: “Eu quero a minha vida de volta!”. Mas que abismo separa estes dois apelos de quem quer a mesma coisa: a vida de volta!

Hoje é domingo de Páscoa, e Páscoa é Ressurreição. O homem já aprendeu muita coisa, mas ressuscitar ainda é só pra Jesus Cristo. O que se pode fazer nesse dia de Ressurreição é pedir pelos enfermos que lutam por um fio de vida, quando um simples aperto de mão ao pedido do médico, ou o simples ato de acompanhar um movimento da enfermeira com os olhos acenam com esperança num status gigante!

Há um poder supremo que tudo pode, e ele se chama fé. E já que não sabemos ressuscitar, quem puder, fique em casa, pelos que já estão doentes, e para que outros não adoeçam. A vida não pode ser egoísta. Nossa vida não é só nossa, pertence também à legião dos que amamos, e que também nos amam... Preservar a vida é também uma forma de ressuscitar todos os dias... Por nós e por todos.


Marina Alves

Comentários

  1. Gostei muito e resolvi compartilhar com você.

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  2. Gostei, todos deveriam ler, refletir Compartilhando.

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  3. Parabéns Marina. Você soube retratar a angústia de um paciente de como se fosse um filme a nossa frente. E a nossa também nesses tempos de caos. Vou escrever sobre o medo também... Ele tem sido a nossa sombra, infelizmente...

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